Passa um dia. Passam dois dias. Passam três. Aparentemente tudo parece bem. Só porque sais de casa bem vestida, maquilhada, de sorriso nos lábios e aparentemente pronta para abraçar todos os desafios que te surgem pelo caminho. Só porque parece que está tudo bem, não quer dizer que realmente esteja. Por vezes queremos acreditar que sim, é mais fácil acreditar numa suave mentira do que enfrentar uma dura verdade.
Tenho ansiedade. Tenho distúrbio de pânico e não tenho uma vida normal. Não, não sou uma vítima. Sim, saio de casa, cumpro o papel que a sociedade me exige, sou aquilo que chamam de “rapariga normal”, porque é exactamente isso que aparento. Transbordo paz de espírito, calma e até resolução pessoal, mas na verdade, escondo uma enorme confusão mental que ninguém conhece.
A sociedade condena pessoas ansiosas. Entendo a perspectiva das pessoas que me rodeiam. Não é fácil aceitar e compreender a diferença. Mas acreditem que também não é fácil viver à margem de tudo. Não estou aqui para reduzir as pessoas que sofrem deste distúrbio, muito menos para enumerar uma lista de sintomas que estão associados a este síndrome, mas sim, para explicar aos outros o quanto é complicado para nós levar uma vida normal.
As pessoas ansiosas estão vedadas à solidão. Primeiro porque não nos sentimos encaixados, porque temos receio de ser condenados e porque o próximo não consegue compreender o que vai na nossa mente. Com o tempo, mudamos a nossa forma de pensar, de viver e de nos relacionarmos com outros. Inevitavelmente, aqueles que nos rodeiam apercebem-se da mudança. Sabem que somos diferentes. Uns julgam, outros questionam, mas de uma forma ou de outra, obrigam-nos a enfrentar uma realidade que queremos esquecer.
Ao vivermos sozinhos não temos percepção de que somos assim tão diferentes, vivemos naquela ilusão reconfortante de que podemos ser como qualquer outra pessoa do planeta. Mas não podemos. Não podemos porque a uma dada altura não conseguimos sair de casa, não conseguimos conviver com os amigos, com o namorado ou com a família. Adquirimos hábitos novos, vamos moldando a nossa vida de acordo com aquilo que a nossa mente exige.
Não é fácil aceitar uma pessoa que se recusa a jantar fora porque tem medo de vomitar num restaurante. Ou aceitar que determinada pessoa não sai de casa porque tem medo de espaços amplos.
A ansiedade não só nos obriga a viver um pesadelo de emoções constante, como ainda nos exige viver nesta extrema diferença. Isolados. Sozinhos. Não me admira que tantos casos estejam associados a comportamentos depressivos.
Apesar de termos consciência da nossa diferença e de sabermos que são os nossos hábitos que nos excluem, é muito complicado conseguirmos mudar. A ansiedade exige de nós um esforço constante e, na verdade, estamos cansados de lutar por uma estabilidade inalcançável.
Eu estou cansada. Todos os dias acordo com um positivismo novo e todos os dias me deito com a sensação de fracasso. Somos demasiado exigentes. Demasiado duros. Mas temos de ser assim, caso contrário ficamos escravos da nossa própria mente e nesse instante, perdemos o pouco controlo que resta da nossa vida.
A ansiedade dói. Dói para quem assiste, para quem nos vê, perdidos no nosso próprio caos mental. Dói para quem vive, porque a nossa consciência nunca cessa. Sabemos que estamos a perder o controlo mas também sabemos que não podemos controlar. É um processo de desgaste constante, que culmina numa fonte de insegurança e total incapacidade. Ficamos vulneráveis, sozinhos e perdidos. Queremos pedir ajuda, mas sabemos que poucos vão ajudar, porque muitos não entendem, outros não se esforçam para entender. Somos obrigados a aceitar os nossos limites. Ainda assim, exigem uma vida plena, que corresponda aos padrões socialmente impostos e, no entanto, não aceitam a diferença, porque a diferença não é poética e não acolhe. Só nos isola. E para isso, já temos a nossa própria mente."
TANIA PEREIRA
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